segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Viver de musica X Conviver em musica I

    Acredito ser essa matéria a primeira que eu escrevo de uma maneira mais direta, e tratando de um problema sério, e não da minha empolgação em estar aprendendo sobre equipamentos. Acho que também ficou claro pra quem já lê esse blog, que não é uma amostra grátis da minha aula de guitarra, e que por tudo que eu construí, perdi e recuperei na minha vida, acho que não é uma matéria sobre coisas óbvias como um exercício que o seu professor de musica tem obrigação de passar e insistir sobre a importância dele, que vai virar discurso nas minhas publicações.

    Não pense no que eu estou escrevendo hoje como um desabafo cheio de revoltas infantis, mas como uma revisão dos meus treze anos de experiência como profissional na área da musica. Vou citar situações, mas não vou sitar nomes, mesmo assim eu garanto que muita gente vai se ver nessas situações. Todos nós passamos por coisas parecidas, e como o meio musical é praticamente uma cidade de interior onde todos nós vamos dar as nossas voltinhas de carro na praça central, provavelmente conhecemos muita gente em comum. Não pretendo também fazer um comunicado em forma de fofocas de vizinhos, pretendo sim expor minhas opiniões sobre a forma que este mercado promissor, disputado, e desvalorizado tem tomado rumos um pouco perigosos, e pode acabar se tornando um setor cada vez menos levado em conta.

    Em primeiro lugar, temos de definir uma coisa simples, que já deveria ser de conhecimento público e encarado com a devida seriedade. Musica é arte sim, e também é atividade profissional sim, e como profissionais de um setor tão importante para a sociedade, é dever cívico lutar para não nos tornarmos uma forma de mão de obra semi-escravizada, e isso acontece sim! Por outro lado, a ética de trabalho deve se tornar cada vez mais divulgada, por que o tal do "puxar o tapete do colega de trabalho" rola solto! Temos de definir que um professor de musica, em sua atividade profissional, está transmitindo o conhecimento adquirido (e pago também) na hora de educar um jovem aspirante a musico, ou desenvolver um trabalho que muitas vezes se assemelha à terapia ocupacional, para um aluno que só deseja executar algumas composições simples do artista que inspira admiração. E lembre-se também, que uma escola de musica, é registrada como uma empresa, ou micro empresa, que presta um serviço ao aluno, ou seja, além da atividade artística e intelectual, temos sim de valorizar e até prestigiar o setor comercial, sem ele, seria inviável ser professor de musica, pois haveria a necessidade de trabalhar em outro setor profissional e nosso setor seria só uma brincadeira de desocupados, o que de fato não é!
    Vamos lembrar que isso deve ser levado em conta para quem atua em palco, estúdio, e qualquer outro setor, não só o ensino musical, dou enfase no setor de ensino por ser a minha principal área de atuação. Com aulas de guitarra eu pago as minhas contas, os meus cursos, os meus livros, os meus equipamentos, comida, gasolina, impostos... Não somos seres tão diferenciados como todos pensam, somos seres humanos, e para os que eu escrevo, somos cidadãos da Republica Federativa do Brasil.

    Quando começamos a trabalhar, não existe um setor de estágios, temos de ir por conta própria, e de maneira "informal" vamos nos tornando profissionais liberais, até que uma escola de musica resolva nos dar a primeira oportunidade, geralmente por indicação de um amigo, ou por amizade com o proprietario. O triste é você ver que enquanto você agarra a sua oportunidade, a primeira que apareceu, você nota que um sujeito despreparado para atuar na área musical usa do "jeitinho Brasileiro" e da conversa para se promover, na região onde eu comecei minhas atividades, virou um argumento semi-verdadeiro o discurso de um cidadão que era mais ou menos o seguinte:
"Ler partitura, que nada, isso já era. Hoje em dia o que pega é outro lance... isso já era".
O pior é que ele convenceu muitos desavisados, e é lógico que o comparativo seria matricular uma criança na escola e ouvir do diretor: "Gramática? Por que ensinar gramática, a metodologia moderna é ensinar leitura através do Facebook, onde a expressão interior supera a capacidade ortográfica."  Assustador e verídico, esse cidadão ensinava guitarra, violão, baixo, bateria e acredite ou não, Piano.

    Aí eu me lembro dos professores da faculdade, alguns me deram ótimas instruções, me tornei um pouco mais apto em harmonia, contraponto, regência, percepção auditiva... mas teve também o outro lado, musico que se encontravam frente a frente de maneira cordial, mas por traz dos panos, um atacava a incapacidade do outro, na tentativa de engradecer seus pequenos atos. Lembro também da frase que eu mais ouvi dentro da sala onde eu fazia aula de guitarra: "Vou tomar um cafezinho e já volto.", mas retirei algo de positivo dessa situação: jamais abandonar um aluno, e jamais tratar meu aluno com descaso. Acho que isso faz diferença, pois tenho uma ótima relação com os meus alunos e no caso dos mais jovens, também com os seus pais.
    Por outro lado, vem o que oferecemos aos alunos como professores e mestres na arte de tocar um instrumento, o produto a ser negociado em questão, nada mais do que nossa forma de conhecer, estudar e fazer musica. Aí vem a parte mais divergente, e mais importante de todas, afinal cada aluno tem suas necessidades e cada professor o seu meio de desenvolver o seu trabalho. Nessa parte é que o nosso dever de informar, e também formar um futuro musico, profissional ou amador, deve ser balizado pela ética. Ética com nosso aluno, com a nossa filosofia de trabalho, com os locais onde trabalhamos, com nossos colegas de trabalho, e também com os nosso concorrentes (por falta de um termo melhor).

   Quanto ao ego do musico, valeria um artigo a parte, e se por acaso eu estiver em outro momento de desabafo, corre o risco de ser este um assunto sobre o qual discorrer. Não vamos ser hipócritas, usando da falsa modéstia para não deixar os outros "constrangidos", não é crime ser bom, nem afirmar isso, mas devemos manter o bom senso. Nem um musico vivo atualmente descobriu a escala maior, assim como nem um engenheiro atual inventou a roda, isso é fato. Acho importante frisar isso, pois sempre tem aquele sujeito que aprende a escala maior e acha que ele é quem é maior do que todos a sua volta. Aprender o óbvio não faz de você um grande sábio, manter a humildade de exercitar as suas habilidades, desde as mais simples até aquelas que exigem o seu máximo, isso é sabedoria.

    Agora, sabe aquele cara que faz o curso do seu lado, e além de achar que esta melhor do que a turma toda junta, ainda fala mal da escola e dos professores. Esse cara se mostra o oposto da minha visão quando entrega o jogo, normalmente ele tem duas intenções:
1- Desanimar os companheiros, para que ele, e só ele seja o detentor do conhecimento. (Geralmente um pobre coitado que não sabe que o Google existe)
2- Esse é normalmente mais perigoso para a instituição de ensino do que para os companheiros de curso, quer vender o mesmo curso oferecido pela instituição.
Nestes dois casos a ética foi pro lixo, mas o pior de tudo, a pessoa não enxerga o fato de ser inconveniente.

    Acho que qualquer dessas atitudes, deveriam ser repensadas, sinceramente. Este desabafo é reflexo de um professor indignado, de um aluno indignado e de musico indignado. Fui claro?